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Lá, onde passei tempos de infância,
numa aldeia, ali, perto de Mafra,
era o tiJaquim a alta instância
local e com a última palavra.
Era sapateiro e Regedor,
mestre na arte da sovela,
no passar do sebo com rigor,
pra evitar ao fio qualquer querela,
quando ele cosia a gáspea à sola
já batida, e com tal preceito,
que, ao fender-lhe, em volta, uma virola
era um corte só, certo, perfeito.
Ora, o tiJaquim sabia tanto
de gáspeas, de solas e pessoas,
que tanto batia numas, quanto
às outras dizia das bem boas.
Chamava à razão o calaceiro,
dirimia zangas quanto a extremas,
levava a casar o trapaceiro
e os seus argumentos eram lemas.
E se o taberneiro, que não tinha
coo martelo alguma afinidade,
martelava o vinho, logo vinha
um cascudo da autoridade.
Se uma vaca, às vezes, de teimosa,
fazia a pastagem predilecta,
comendo, ora a erva, ora a rosa,
ficavam, vaca e dono, de dieta.
Tendo o tiJaquim aceitação,
pra ser Regedor ou Presidente,
nunca se achegou ao rabecão,
prova de que era inteligente.
É que lá, no rio da sua aldeia,
não havia arraia que estendesse
o seu manto como panaceia,
se além da sovela se atrevesse.
Se a moldar a sola ele era audaz
e a tocar as reses, bom pastor,
não seria mais que capataz,
se ousasse ir além de Regedor.
Era o tiJaquim um sapateiro,
vendo muito além da meia-sola,
mais do que avis rara em cativeiro
circunscrita à área da gaiola.
O tiJaquim sapateiro foi Regedor da freguesia do Gradil, entre 1955 e 1960, pelo menos. Era um bom homem, junto de quem eu gostava de ficar a ouvir lendas, enquanto brincava com o gato, e a vê-lo trabalhar.
(imagem: Human eye and sunset - Whitney & Irma Sevin AllPosters.com)